
No capítulo do livro intitulado Holopatogênese: esboço de uma teoria geral de saúde-doença como base para a promoção da saúde, Almeida-Filho discute o objeto saúde-doença trazendo referenciais epistemológicos e conceitos teórico-metodológicos em torno da proposta de uma abordagem que ele denomina de holopatogênese. Segundo Almeida-Filho, 'holopatogênese' pode ser entendida como o conjunto de processos de determinação (genesis) de doenças e condições relacionadas (pathos) tomadas como um todo integral (holos), envolvendo todas as facetas, manifestações e expressões do objeto complexo saúde-doença. Este autor explicita ainda que o conceito de holopatogênese deve ser interpretado como um tipo especial de objeto-modelo heurístico, que opera em diferentes níveis hierárquicos de complexidade, concomitantemente dependente de substrato ontológico e simbólico.
Nesse perspectiva, observo que o objeto de conhecimento dos subcampos disciplinares que compõem o campo da saúde operam inadequadamente o conceito saúde-doença na medida em que este é reduzido à compreensão de 'saúde como ausência de doença ou vice versa'. É in-coerente pensar em uma desarticulação entre o elemento biológico e os fatores sociais, demográficos, culturais, econômicos, ecológicos e políticos, sobretudo, quando se pretende uma análise totalizadora e respeitosa da complexidade dos fenômenos da vida, saúde, doença, dor, sofrimento e morte. Diante dessa problemática, a noção de holopatogênese propõe a integração entre a tecnociência e a vida, ou seja, que todos esses fatores, ora mencionados (pensar numa perspectiva fluída, não dogmática e ampliada...entender que se trata de uma noção que não se fecha [divergente], pois novos fatores poderão surgir [e surgirão!!] e serem acoplados [nos termos de Almeida-Filho, "acoplamento estrutural"] no condicionamento/determinação da saúde e da doença), devem ser integrados na construção do objeto doença-saúde.
Concluindo, penso que uma construção linear do objeto saúde-doença (a exemplo: saúde como ausência de doença) não dá (e não vem dando) conta das demandas e expectativas em saúde-doença, pois estas não são estáticas. Pelo contrário, são geradas por sujeitos dinâmicos, e estes, por sua vez, são interativos, ativos e (re)ativos em consonância com o texto/(con)texto em que vivem e ao espaço/tempo em que habitam (inclusive a própria pele). De modo antagônico, são as estruturas estruturantes da noção negativa de saúde-doença (estas são rígidas, controladoras, restritas e restritivas). Deixo aqui a minha provocação impregnada de "borrosidade".
A imagem aqui postada é uma 'tentativa borrosa' para um pensar sobre a complexidade que é o objeto saúde-doença.
Referência:
- Almeida-Filho N. Holopatogênese: esboço de uma teoria geral de saúde-doença como base para a promoção da saúde. In: Czeresnia D. Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendência. Rio de Janeiro: editora Fiocruz; 2003.
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ResponderExcluirDando seguimento ao tema...
ResponderExcluirÉ importante ver que o debate trazido pelo texto emprega uma lógica distinta de A = -B, sendo A Saúde e B Doença. Isso quer dizer que não entendemos mais a existência de um fenômeno quando o outro está ausente, mas sim ambos existindo ao mesmo tempo.
Parece óbvio, mas isso transforma completamente nossa forma de compreender o modo como os fenômenos se conformam e de que forma é possível intervir neles. Isso produz uma nova condição para a ação, ou seja, oferece subsídios para novos modelos de ação.
A metáfora da borrosidade é um recurso poderoso para representar o "inter", que é possível agora a partir do momento que concebemos mais de uma dimensão operando ao mesmo tempo, A e B pelo menos, com a perspectiva de C, sendo este a intervenção.
A repercussão do debate envolve tensão, obviamente, pois a proposta implícita envolve certa superação da ideia de domínio do objeto e, consequentemente, dos atos. O debate anterior sobre formas de determinação e a incorporação da proposta de múltiplas determinações nos insere no campo das incertezas, este que é avesso ao campo das verdades científicas.
A provocação é pertinente e potente, na medida em que nos convoca a refletir sobre os modos de pensar o objeto de tal forma que altera os modos de produzir conhecimento, consequentemente. Rumamos para a superação da “estética plena” quando assumimos que o borrão é inevitável quando pretendemos pensar de fato em algo maior.